A investigação caracteriza-se como revisão descritiva, temática, a partir do
levantamento e análise do que foi publicado sobre o fenômeno objeto deste
estudo em artigos publicados em periódicos nacionais, nos últimos 10 anos, tendo
como fonte de pesquisa as bases de dados on-line Lilacs, Scielo, PubMed,
Bireme e Google acadêmico.
A
técnica de investigação foi subdividida em quatro fases – identificação,
localização, compilação e fichamento dos artigos, conforme recomendações de
Marconi e Lakatos.
Para
identificação e localização dos artigos foram utilizados os uni-termos –
conteúdos, conhecimentos escolar, saberes escolares, currículo, prática
pedagógica docente, Educação Física, Educação Física Escolar, prática
pedagógica docente, Cultura Corporal e Cultura Corporal do Movimento. Ainda,
buscar em conjunto foram realizadas com mais de uma palavra chave (exemplo:
conteúdos + educação física; conhecimentos escolar + educação física ...).
Ao
todo foram identificados oitenta e dois artigos, dos quais após a análise do
título, do resumo e da fonte de publicação foram selecionados vinte e quatro
que se enquadravam nos critérios de inclusão, isto é, relacionavam-se ao Ensino
Fundamental. Foram descartados trinta e cinco artigos que não estavam
relacionados ao Ensino Fundamental e outros vinte e três que também se
encontravam dentre os critérios de exclusão, a saber: a) estudos realizados na
Educação Infantil ou Ensino Médio; b) investigações publicadas em livros; c)
estudos cujos resultados apresentavam depoimentos dos participantes sem deixar
claro se este correspondia a uma opinião isolada ou fruto de um número
expressivo de participantes da pesquisa.
Na
perspectiva de apresentar uma síntese dos artigos analisados foram organizados
quadros dos principais aspectos encontrados – autoria e data, objetivos dos
estudos, metodologia utilizada e principais resultados e conclusão.
Resultados
e discussão
A
Educação Física, componente curricular obrigatório da Educação Básica, traz em
suas propostas diferentes conteúdos possíveis de serem trabalhados no âmbito
escolar, conhecimentos estes que podem resultar em diversas contribuições à
formação e desenvolvimento humano. Nas séries iniciais do Ensino Fundamental,
embora não tenhamos observado a aplicação de vários conteúdos propostos pelos
PCN’s, o desenvolvimento de jogos, ginástica, dança, atividades recreativas e
habilidades motoras, foram identificados em apenas seis dos vinte e quatro
artigos analisados, conforme quadro 1.
Sobre a importância
de trabalhar conteúdos diversificados nas aulas de Educação Física Betti e
Zulliani ressaltam que o profissional da área, respeitando os limites
individuais, deve proporcionar aos alunos oportunidades para a realização dos
jogos, esportes, atividades rítmicas/expressivas, lutas e artes marciais,
ginástica e prática da atividade física, assim como a exploração das variações
desses conteúdos, principalmente nas séries iniciais. Sendo assim, nessa fase
do Ensino Fundamental é preciso considerar a atividade corporal como elemento
fundamental da vida infantil, sendo a estimulação adequada e diversificada
essencial para isso.
Barbosa-Rinaldi et
al. salientam que os jogos na Educação Física configuram-se como
oportunidades importantes para formação cultural da criança e valorização da
pluralidade cultural. Em grande parte os jogos infantis consistem em ações
ligadas à cultura popular que favorece experiências em grupos, convivência e
cooperações, não estando relacionados aos ditames da Indústria Cultural,
permitindo que as crianças possam ser agentes de sua própria cultura.
Considerando que as
oportunidades de jogos e brincadeiras no contexto informal têm sido
restringidas devido a barreiras como a falta de espaços físicos, nível de
conservação, violência, dentre outros, torna-se relevante que tais atividades
tenham espaço no âmbito escolar, principalmente no recreio e aulas de Educação
Física. Esses momentos são privilegiados para as experiências infantis e são de
suma importância para o desenvolvimento social, principalmente quando
trabalhados numa perspectiva aberta e crítica.
Contudo, é preciso
estarmos atentos ao fato de que ao enfocarmos a importância e os benefícios que
podem advir do trabalho com os jogos na escola, não estamos nos referindo ao
jogo numa perspectiva meramente “recreacionista”, baseada em apenas deixar as
crianças brincarem. Esta experiência infantil por si só tem seu significado e
também poderia contribuir para o desenvolvimento da criança em outros
contextos, mas não careceria de um profissional para acompanhá-lo, nem mesmo
ser parte do componente curricular, caso fosse desenvolvido nesta perspectiva
nas aulas de EF. Os jogos que estamos nos referindo são os jogos enquanto
conteúdo da EF, tratados e estudados, entendidos como conhecimento da Cultura
Corporal do Movimento historicamente construída, que a partir das necessidades
dos alunos são planejados, organizados, sistematizados e desenvolvidos didaticamente
no âmbito escolar pelo profissional de EF.
Os jogos e as
atividades recreativas em geral, podem favorecer a formação autônoma dos
alunos, uma vez que sua realização exige atitudes de liderança, obediência,
conflitos, discussões e construções coletivas, comportamentos essenciais à
formação política e social do indivíduo, principalmente quando o educador
utiliza como estratégia de ensino a resolução de problemas, partindo de ações
simples relacionadas à manifestação da Cultura Corporal do Movimento como
descentralizar as decisões sobre as ações corporais e suas regras, porém não
abandona sua condição de professor, possuidor de saberes que serão
sistematizados e tratados junto aos alunos.
Desta
forma, entendemos que as aulas EF não devem se limitar apenas a proporcionar
aos alunos o contato e a vivência desses conteúdos, mas também possibilitar que
os mesmos sejam vivenciados em diferentes perspectivas, não se limitando a
reprodução e perpetuação de suas características e valores, mas sim os ressignificando.
Uma estratégia
interessante e possível de trabalhar com os jogos, nessa concepção mais ampla,
é implementar a didática proposta por Rangel e Darido jogo jogado,
transformado e criado – e expandida por Silva e Sampaio – jogo jogado, ampliado,
transformado e criado. A partir da valorização e trabalho com o conhecimento da
Cultura Corporal do Movimento do aluno, advinda do contexto extraescolar,
busca-se enriquecer seu repertório com a inclusão de novos saberes oriundos dos
estudos de seus professores por meio do jogo ampliado. Essa perspectiva promove
mudanças nos jogos já existentes, reconhecendo que a cultura é histórica e
dialética e que em cada contexto e espaço/tempo sofre alterações (jogo
transformado) e que o conhecimento não é estático, devendo a educação promover
o surgimento de novas formas de jogar (jogo criado).
Observou-se
que alguns outros conteúdos como a dança, a ginástica rítmica, as atividades
motoras foram desenvolvidas nas aulas de Educação Física além dos jogos e
atividades recreativas. Contudo, os estudos analisados concluem apontando para
a necessidade de estratégias que melhorem o processo de criatividade e a
participação efetiva dos alunos, bem como a percepção de que o espaço físico
muitas vezes é inadequado para a ampliação do repertório a ser trabalhado nas
aulas de Educação Física.
Embora se tenha uma
ampla discussão apontando para a importância de desenvolver conteúdos
diversificados nas aulas da Educação Física, os estudos aqui analisados
apresentam outra ênfase e direcionamento, podendo comprometer em muito o
processo de formação, uma vez que a maioria das crianças encontra-se entre 6 a
10 anos e o conteúdo predominante tem sido o esporte, como se pode observar em
quatro dos estudos analisados (quadro 2).
A análise dos estudos sobre os conteúdos desenvolvidos nas
aulas de Educação Física do Ensino Fundamental, em especial das séries finais,
apresentou-se como mais preocupante, pois a maioria dos estudos analisados
constata que os esportes figuraram como conteúdos predominantes, quando não
exclusivos, conforme pode ser visualizado no quadro 3.
Embora não se possa
negar a importância da aplicação dos esportes enquanto conteúdo da EF,
considerando que este se apresenta como um patrimônio da cultura brasileira e
como um dos conteúdos preferidos pelos alunos (conforme evidenciado em três
artigos avaliados, realizados em São Paulo – SP, em Osasco, SP e em
Indianápolis, MG), sobre sua predominância recai diversas críticas. Em especial
nos atemos a discutir duas delas uma, a limitação do conhecimento dos alunos à
apenas uma das diversas manifestações da Cultura Corporal do Movimento e,
outra, as formas e os valores com que os esportes são trabalhados nas aulas.
Restringir as
experiências corporais nas aulas apenas a um tipo de conteúdos, independente de
qual seja ele, pode resultar em significativos prejuízos ao desenvolvimento da
Cultura Corporal do Movimento e da educação para a saúde e o lazer. Se por um
lado, a variabilidade de movimentos é fator necessário para o surgimento de
novos movimentos38, por outro, as oportunidades de conhecer e reconhecer
diferentes conteúdos é fundamental para que o indivíduo tenha uma atitude
favorável à ocupação do tempo disponível com atividades que tragam qualidade de
vida no presente e marquem positivamente a continuidade destas no futuro.
As aulas de Educação
Física constituem-se em oportunidades favoráveis à ocorrência do duplo processo
educativo do lazer, pois de acordo com Marcellino, o lazer pode agir como
veículo e produto de educação, primeiro por se constituir numa oportunidade
possível de desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos (educação pelo
lazer) e segundo por configurar-se como objeto de educação, devendo as pessoas
ser iniciadas nos interesses culturais do lazer e incentivadas a vivenciá-los
em níveis médios/críticos e superiores/críticos-criativos (educação para o
lazer).
Sobre as formas com
que os esportes são trabalhados na escola, embora não se possa generalizar e
estender essa condição à Educação Física como um todo, não se pode negar que
muitas vezes os esportes encontram-se carregados de valores decorrentes do
sistema capitalista, fazendo com que princípios de rendimento (melhores contra
piores) predominem sobre os educacionais. Constata-se uma tendência dos
professores adotarem uma pedagogia tecnicista em suas aulas, com ações
repetitivas e fragmentadas, até mesmo às vezes exigindo do aluno um
comportamento de atleta, contribuindo para que ocorra uma reprodução das
desigualdades sociais, exigindo que o aluno se adapte ao esporte, respeitando
as regras previamente impostas, sem poder discutir e vivenciar alternativas.
Além de se manifestar
como conteúdo predominante em dezessete estudos, sendo quatro nas séries
iniciais e treze nas séries finais do Ensino Fundamental, a utilização dos
esportes tradicionais (futebol, voleibol, handebol e basquetebol) com ênfase
nas regras oficiais e baseados em princípios de rendimento foi observado em
quatro dos artigos analisados – Porto Alegre, RS, Rio Claro, SP, Salvador, BA e
Rio de Janeiro, RJ.
Considerando as
justificativas e os valores que por vezes sustentaram (e ainda sustentam) a
prática do esporte no âmbito escolar como ensinar a respeitar as regras do
jogo, a ter companheirismo, a desenvolver o respeito às autoridades, como árbitros,
dentre outros, há controvérsias sobre suas reais contribuições positivas no
processo educativo. Bracht expõe que, em sua maioria, o que predomina nas
aulas de Educação Física são o ensino incondicional das regras e o conformismo
alienante da ideologia capitalista “com a exacerbação do espírito competitivo
do esporte escolar, as técnicas esportivas e o próprio esporte foram elevados à
condição de finalidade, ou seja, o esporte enquanto fim em sim mesmo” (p. 65).
A respeito das
características do esporte praticado nas escolas ou no tempo de lazer, Daolio e
Velozo expõem que:
“De
fato, é possível presenciar atividades esportivas no tempo de lazer ou
competições escolares praticadas com os códigos e valores do esporte de
rendimento, como busca feroz pelo primeiro lugar, a ansiedade pela vitória a
qualquer preço, a rígida reprodução de regras e técnicas (p. 12).”
A
presença das características socioculturais de rendimento exigidas do esporte é
tão forte que até mesmo nas ocasiões em que os professores os classificam como
recreativos elas estão presentes, sejam através das regras ou pelos
comportamentos de exclusão, conforme observado por Scherer e Molina Neto26 em
Porto Alegre, RS.
“Mesmo
que a perspectiva recreativa seja a mais observada durante as aulas de educação
física, as regras oficiais, como o número exato de jogadores, a necessidade de
ter um árbitro e as novas regras vinculadas ao voleibol, entre outras,
caracterizaram que o modelo de esporte de alto rendimento ainda serve como
sustentação da prática pedagógica dos professores de educação física da escola
pública. Ainda, nas nossas observações, identificamos a exclusão de alunos do
jogo esportivo, apesar de esforços dos professores em fazer todos participarem
(p. 78).”
Em
relação às críticas sobre a utilização dos esportes no âmbito escolar, que com
frequência se resumem ao ensino apenas dos tradicionais – futsal, voleibol,
basquetebol e voleibol –, é preciso ter claro que o que se defende não é a
exclusão desses esportes das aulas, mas sim a mudança tanto em sua
exclusividade, quanto na forma fragmentada e mecanizada com que eles são
desenvolvidos, considerando que sua prática tem como parâmetro de certo ou
errado apenas as ações técnicas esportivas, tida como corretadas apenas aqueles
que correspondem a um modelo padrão de movimento. Daolio e Velozo alertam que
“... uma única maneira de executar um movimento esportivo torna-se o padrão de
correção, e todas as outras formas são tidas como errôneas, incompletas ou
variantes menos desejáveis da técnica considerada perfeita” (p. 13). Dessa
forma o ensino da técnica esportiva não pode ser reduzido apenas ao ensino de
ações corporais baseadas em princípios biomecânicos utilizados no esporte de
rendimento, pois os aspectos culturais também se fazem necessários considerando
que diversos são os motivos que levam as pessoas a vivenciar o esporte.
Nesse
sentido, a escola enquanto instituição promotora de conhecimento e acesso à
cultura, ao adotar o esporte enquanto conteúdo da Educação Física, deve
desenvolver no aluno a capacidade de refletir sobre as diversas nuances,
valores e atitudes que estão inseridos nos esportes, desenvolvendo assim
competências para que se beneficiem do esporte como uma, dentre várias outras,
possibilidades de manifestações da Cultura Corporal do Movimento. Vivenciadas
por meio de sua prática, contemplação ou conhecimento, não somente ao longo da
sua formação, mas por toda a vida, seja com objetivos de ocupação do tempo
disponível como oportunidades de lazer, melhora do bem estar e qualidade de
vida, promoção da saúde ou prevenção de doenças, mas que, em todas essas
oportunidades, possam agir de forma autônoma (crítica e/ou criativa).
Em
relação às perspectivas dos alunos sobre o esporte e a forma com que ele é
trabalhado na escola, não se pode caminhar por uma via de mão única, pois se
por um lado existem alunos que são motivados pela aprendizagem da técnica, há
também estudos evidenciando que a participação nas aulas para ficar mais habilidoso
figura como o último motivo escolhido entre as opções pelos alunos do 5º (12,6%)
e 7º (8,9%) ano do Ensino Fundamental e 1º ano do Ensino Médio (8,5%) de Rio
Claro, SP, o mesmo ocorrendo no Ensino Fundamental em escolas públicas
(10,4%) e particulares (3,9%) de Florianópolis, SC. Ainda, há de levar em
conta as pesquisas que indicam que o padrão estereotipado existente na prática
esportiva escolar e as atitudes negativas e constrangedoras de uns colegas em
relação a outros em sala de aula – comentários desagradáveis, gozações,
humilhações e/ou até mesmo agressões –, somam-se à limitação dos conteúdos de
esportes como os principais motivos responsáveis pela não participação nas
aulas de Educação Física.
Destacamos
novamente que ao criticar a forma com que o esporte é tratado na escola e
propor uma intervenção pedagógica crítica sobre ele não implica negá-lo
enquanto conteúdo, como Bracht fez questão de esclarecer em seus escritos
posteriores aos de 1986.
Ao
contrário de negar, entendemos que a escola, por meio da Educação Física,
figura, como um dos poucos momentos possíveis, para que questões relacionadas
ao esporte sejam discutidas. Entre elas estão questões necessárias como a
ocorrência de burnout, de mercantilização do esporte, de compra de resultados,
do uso de anabolizantes, de transformação do corpo em mercadoria, de uso do
corpo como máquina, de estereótipo de gênero, de racismo, de patriotismo, de
resgate das práticas esportivas populares, de análise da influência da mídia
sobre os conteúdos da EF, da utilização do esporte para fins ideológicos e
políticos, da violência dentro e o fora dos estádios, dentre outras questões.
“...
nossa defesa não é por sua abolição das aulas, mas sim por um trato pedagógico
do esporte – analisando o tipo de educação veiculada por uma ou outra forma de
manifestação esportiva – para que se torne educativo numa determinada
perspectiva (crítica) de educação43 (p. 17).”
Uma
possibilidade de intervenção crítica, por intermédio da tematização do esporte
(futebol), é apresentada por Souza Junior e Darido44, abrindo possibilidades à
formação para o lazer, pois além de introduzirem o aluno num dos interesses
culturais – físico/esportivo – os autores estabelecem conexões à vivência das
diversas maneiras de ação no tempo disponível, seja pela prática (realizando o
esporte), seja pela busca de conhecimento (pesquisas sobre os esportes e sua
história, mudanças nas regras, o esporte na vida do aluno) ou seja pela
contemplação (apreciação de quadros, filmes, o jogo em casa pela TV ou nos
campos, quadras e estádios). Ainda, ao discutir aspectos relacionados a
atitudes na escola, a proposta dos autores pode contribuir com a estimulação a
que esses alunos venham a atuar no lazer numa perspectiva critica e/ou crítica/criativa.
Contudo,
é preciso estar atento ao que se apresenta como possibilidade e o que tem
ocorrido no âmbito escolar, para não cairmos ou permanecermos num discurso
vazio, que não resulta em mudanças no fazer pedagógico escolar. Mesmo existindo
possibilidades em termos ideais da recriação do “esporte na escola”, esta se
manifesta de forma restrita40 e não tem se efetivado em grande parte das
experiências, pois embora a escola tenha possibilidade de se constituir num
espaço de resistência, de lutas, de contra hegemonia e de contracultura46, o
fazer pedagógico docente é influenciado por diferentes fatores.
Dentre os fatores que
podem restringir as possibilidades de diversificação dos conteúdos nas aulas de
Educação Física, entre os professores participantes dos artigos analisados,
destacam-se os relacionados às experiências docentes – identidade do professor
com o esporte, formação inicial dos professores pautada na matriz curricular
esportivista e pedagogia tecnicista e falta de domínio de conteúdos como a
dança e lutas.
Cabe
ressaltar que muitos professores que atuam no âmbito da Educação Física Escolar
foram formados com base na resolução CFE nº 03/87, que estabelecia a formação
de profissionais em Educação Física em quatro anos, com carga horária de 2.880
horas, sendo 80% destinados a formação geral (conhecimento técnico,
conhecimento filosófico, conhecimento de sociedade e conhecimento do ser
humano) e destes 60% direcionados aos conhecimentos técnicos, o que tem levado
professores a indicarem que o tipo de formação inicial não os prepara para
atuação.
Contudo,
os fatores que interferem na prática pedagógica docente não se limitam a estes,
pois a falta de estrutura e materiais e a falta de tempo para o planejamento também
se mostraram influenciadores.
Esses
resultados nos convidam a refletirmos sobre a necessidade de mudanças na
estrutura administrativa que rege a Educação Básica em nosso país e a respeito
da estrutura curricular de formação inicial de professores de Educação Física,
pois se nos últimos 20 anos diversas propostas foram elaboradas a fim de
promover uma educação cidadã e democrática, dentre elas a valorização do
conhecimento e necessidades da comunidade através da reformulação do currículo;
a necessidade dos conteúdos serem trabalhados em suas três dimensões
(conceitual, procedimental e atitudinal); a ampliação das possibilidades de
manifestação da Cultura Corporal do Movimento, no caso da Educação Física;
pouco se tem evoluído em relação a promoção de melhores condições de trabalho
aos docentes. A insuficiência do tempo de planejamento também foi apontada por
professores de Educação Física de outros estudos como um dos principais fatores
limitadores na elaboração de aulas em suas três dimensões.
A
respeito do não alcance e não efetivação de novas propostas educacionais, no
âmbito escolar, que contemplem a pluralidade das manifestações da cultura
corporal do movimento é importante considerar também, conforme nos lembra Bauman,
a fluidez e liquidez com que o conhecimento é produzido na “Sociedade Líquida
Moderna”. A sociedade em que nos encontramos imprime um ritmo acelerado,
tornando as possibilidades obsoletas antes mesmo de seus atores terem
aprendido, ou seja, as mudanças têm ocorrido num ritmo tão acelerado que impede
a criança de experimentar novos hábitos e rotinas, sendo necessária a formação
contínua dos profissionais da educação.
Considerações Finais
Os
dados obtidos na análise dos artigos sobre os conteúdos trabalhados na EF
escolar mostram duas situações que desafiam a reflexão sobre a área. A primeira
refere-se aos conteúdos propriamente ditos e à forma com que eles vêm sendo
trabalhados no âmbito escolar. A segunda, dentro da realidade possível, identificar
que a despeito de diversos fatores críticos, a ênfase no conteúdo esporte pode
ser ressignificada nas aulas de Educação Física.
A
respeito dos conteúdos e a forma com que eles vêm sendo trabalhados, embora na
atualidade diversas sejam as contribuições que buscam proporcionar uma ação
pedagógica diferenciada da fragmentação dos esportes em fundamentos, os estudos
analisados mostraram que essas propostas não têm atingido e se efetivado na
prática pedagógica dos docentes participantes dos estudos analisados,
contribuindo assim, para que exista uma tendência de monocultura corporal do
movimento nestes contextos, centrada nos esportes.
Entre
as possíveis consequências deste conteúdo predominante na EF, estão os sérios
prejuízos, tanto no que tange a restrição ao acesso à cultura produzida pela
sociedade no período de escolarização quanto à sua vivencia após a etapa de
formação, fator que pode contribuir negativamente nas atitudes a serem tomadas
frente à ocupação do tempo disponível com o lazer e na compreensão da
importância para a saúde e qualidade de vida advindas da Cultura Corporal do
Movimento.
Contudo,
embora as condições sejam desfavoráveis, a necessidade de buscar implementar
uma pedagogia crítica do esporte no âmbito escolar se torna cada vez mais
necessária, devido ao aumento da alienação por intermédio das práticas
corporais em relação ao corpo, não mais apenas pela reprodução de movimentos,
mas também pelo crescente uso de anabolizantes e de cirurgias plásticas em
busca do “corpo perfeito”, apregoado como ideal, independente se saudável ou
também pela violência que permeia o lazer nos estádios, o consumismo e a venda
do corpo ainda quando criança, a segregação de gêneros no esporte, entre outros
problemas que assim como ocorreram nas atividades cotidianas se reproduzem e
são reforçadas no esporte.
Assim,
vislumbramos como uma dos caminhos a serem seguidos, pelos profissionais da
área, para uma ação pedagógica inclusiva e democrática está a possibilidade de
ressignificação do esporte por meio de uma prática esportiva escolar que
contribua para desvelar e enfrentar esses valores geradores de exclusão,
segregação e univocidade de horizontes na manifestação da Cultura Corporal do
Movimento, que no nosso entender, pode ocorrer por meio da tematização dos
esportes e utilização das estratégias de ensino descoberta orientada ou
resolução de problemas. Esse estilo de ensino busca provocações cognitivas, por
meio de uma nova atividade ou por meio de sua ajuda aos alunos, cujo objetivo é
incentiva-los, por intermédio de perguntas, a refletirem e a buscarem soluções.
Parte-se de uma situação inicial que estimula e aguça a curiosidade do aluno
via situações didáticas, que, a fim de uma formação autônoma, podem ser criadas
pelo professor ou pelos próprios alunos, ou seja, o problema “... permite a
descoberta, a partir de elementos de base conhecidos (pesquisa de variantes a
partir do ensino de uma dificuldade) [...] debates entre os alunos ou entre os
alunos e o professor, com o objetivo de provocar reflexões e evocações” (p.
61).
Outra possibilidade de uma ação pedagógica
inclusiva e democrática consiste em trabalhar diversos jogos, a dança, as
lutas, as ginásticas, as atividades lúdico-recreativas entre outras, na EF
contemplando o conhecimento da Cultura Corporal do Movimento historicamente
construída e que a partir das necessidades dos alunos e dos objetivos traçados
pelos professor, são planejados, organizados, sistematizados e desenvolvidos
didaticamente no âmbito escolar, possibilitando uma estimulação adequada e
diversificada essencial a formação humana.
Por
fim, cabe ressaltar que, conforme foi evidenciado nos estudos analisados, a
prática pedagógica docente pode ser influenciada por diversos fatores, dentre eles
a identificação do professor com o esporte por sua prática anterior, pela
formação inicial, pela experiência docente, pela falta de estrutura e materiais,
pela falta de tempo para o planejamento e reflexões como base para o encontrado
na prática docente que não amplia o desenvolvimento de outros conteúdos, mas
restringe a EF algumas modalidades esportivas.
Em síntese, a pesquisa
realizada apresenta contribuições ao descrever os achados em artigos sobre os
conteúdos trabalhados na EF, no entanto, reconhecemos suas limitações no que
tange às fontes utilizadas (publicações em periódicos) como objeto de
investigação. Em futuras pesquisas sobre essa temática, outras fontes de dados,
como livros, dissertações de mestrado e teses de doutorados também devem compor
o conjunto da análise a fim de possibilitar a ampliação das descobertas para
uma proposta pedagógica inclusiva e democrática para a área da EF.
Olá, a construção do blog está atendendo os critérios e orientações, porém sugiro que as informações que estão no campo" interesses" sejam reorganizadas na guia lateral da página ou no cabeçalho, para melhor identificação.
ResponderExcluirOutra coisa, sobre as referências. O blog deve citar as fontes e referências do material pesquisado, para o devido reconhecimento...